Dedicado à Pietra Andrade Rodrigues, autora da idéia - 15 de Julho de 2010

quinta-feira, 2 de julho de 2020

O Vigilante Rodoviário

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O Vigilante Rodoviário
Produção: 1960/61
Número de Episódios: 38 (Preto e Branco)
Elenco: Carlos Miranda no papel do Inspetor Carlos
Criação: Ary Fernandes
Produção: Ary Fernandes e Alfredo Palácios - IBF
Patrocínio: Nestlé
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A serie de TV "O Vigilante Rodoviário" focava as aventuras de um policial que, em companhia de seu cão, na patrulha de rodovias brasileiras, lutava contra malfeitores combatendo a criminalidade.
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O criador desta série - Ary Fernandes - sempre foi fã de histórias em quadrinhos. Além disso, acompanhava seriados em preto e branco de 12 ou 15 capítulos, que em sua juventude eram exibidos nos cinemas antes do filme principal. Sempre questionou sobre o porque de não existirem heróis brasileiros em tudo que assistia.
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Ary Fernandes
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Em 1952 Fernandes foi indicado por Alfredo Palácios para trabalhar na Companhia Cinematográfica Maristela, situada no bairro do Jaçanã, zona norte da cidade de São Paulo. Em 1959 passou a atuar como diretor de comerciais para televisão. Na ocasião, tornou-se fã de um personagem de HQs chamado "O Vingador". Foi a partir daí que Fernandes começou a desenvolver um herói com as características de um patrulheiro rodoviário. E inspirado na série de TV "Rin Tin Tin", resolveu que o herói teria um cão como companheiro.
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Alfredo Palácios (a esquerda) e Ary Fernandes (a direita)
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Contando com a ajuda de Alfredo Palácios, Fernandes agendou reuniões com a Força Pública e com a Polícia Rodoviária. O projeto era filmar um piloto tendo como tema o roubo de um grande diamante. Ari Fernandes e Alfredo Palácios receberam total apoio dos orgãos oficiais mas não tinham dinheiro para viabilizar a produção. Um amigo de ambos cedeu-lhes um estúdio de gravação, quatro latas de mil pés de negativo de 35 mm e um automóvel da marca Chrysler. A câmera utilizada seria uma Arriflex 35mm comprada por ambos da já extinta Maristela. A equipe de produção era a mesma da Maristela. Restava escolher qual ator viveria o personagem principal.
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Carlos Miranda não era ator. Poucos sabem, mas ele atuava como iluminador na extinta Maristela e acabou sendo escolhido por sugestão da esposa de Ary Fernandes. O cão escolhido acabou sendo um vira-lata (na série era tratado como sendo da raça Pastor Alemão).
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As filmagens do piloto foram realizadas na Via Anchieta, em São Paulo, mais precisamente no acesso ao Caminho do Mar. Tomadas foram feitas também no porto da cidade de Santos. A produção desse episódio inicial consumiu duas semanas de trabalho. A revelação do filme foi feita no Laboratório Bandeirantes. A finalização de edição foi feita em estúdio da TV Record Canal 7 de SP, próximo do Aeroporto de Congonhas. Durante esse processo, foi preciso reduzir o filme de 35 mm para 16 mm. A sonorização só foi levada a efeito depois, no estúdio caseiro de um técnico de som chamado Mário Sidow. Atores de radionovelas foram usados na dublagem visto que o trabalho de Mário era feito com divisão de pistas dos canais de som, sem misturar captações de áudio. A sonorização musical foi feita por Paulo Bergamasco. Com tantas e imensas dificuldades, tal piloto só ficou pronto em 1960, mais de um ano após terem sido iniciadas as gravações.
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Ary Fernandes orienta a equipe - 1960
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O passo seguinte foi buscar empresas de publicidade com a ideia de bancar a produção de uma primeira temporada com 39 episódios. Várias foram as visitadas. Dentre elas: Norton, Thompson, McCann Erickson e Standard Propaganda. Durante a exibição do episódio piloto na Norton, estava presente o publicitário Carlito Maia, encarregado da conta da Nestlé. Com excelente recepção entre os presentes, a proposta foi levada pessoalmente ao suíço Gilbert Valterio, que na condição de diretor comercial da Nesté negociou o financiamento do projeto pela multinacional.
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Bastidores de Gravação
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Para iniciar a produção, Ary Fernandes e Alfredo Palácios criaram a IBF - Indústria Brasileira de Filmes. A verba da Nestlé era repassada para a Norton, que por sua vez repassava para a IBF. Norton e Nestlé fecharam um contrato de exibição da série com a TV Tupi, Canal 4 de SP. Com isso, o projeto ganhava alcance nacional através de exibições por afiliadas.
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A partir daí a mídia passou a dar amplo espaço para o programa, a ponto de um enorme painel com o Vigilante e seu cão Lobo ser instalado no início da Via Anchieta. A estréia ocorreu no dia 03 de Janeiro de 1961, as 20h00. O primeiro episódio alcançou a média de 33% de aparelhos ligados. O segundo episódio registrou a incrível marca de 55%.
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Lançamento pela TV Tupi Canal 4 - SP - Janeiro 1961
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Como na ocasião apenas 30% dos lares brasileiros possuíam televisão, surgiu a idéia de unir 05 episódios, compondo um longa metragem para ser exibido nos cinemas. O lançamento do primeiro longa ocorreu no Cine Art Palácio, em plena Avenida São João, Centro de São Paulo, região conhecida informalmente como Cinelândia Paulistana. O filme alcançou distribuição nacional, com grande sucesso. Um segundo longa resultante da união de mais episódios foi produzido algum tempo depois e graças a essa estratégia O Vigilante Rodoviário tornou-se o primeiro grande herói nacional.
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A contratação de atores profissionais para atuar como convidados valorizava ainda mais a produção. Dentre eles, podemos citar nomes como os de Stênio Garcia, Rosamaria Murtinho, Geraldo Del Rey, Milton Ribeiro, Fúlvio Stefanini, Ary Fontoura e até cantores como Juca Chaves e Tony Campello.
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A escolha do automóvel Simca Chambord ocorreu graças ao fato da equipe de produção ter alugado uma unidade e ter gostado muito do carro. Como a Simca não estava bem em termos de vendas, outras unidades foram cedidas pela empresa. Satisfeita com a divulgação que lhe possibilitou alavancar vendas, criava a Simca naquele momento o primeiro exemplo eficiente de merchandising no Brasil.
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Apesar do imenso sucesso, o cancelamento da série ocorreu após a produção do episódio 38. As instruções 204 e 208, promulgadas pelo então Presidente Jânio Quadros, taxavam em 100% produtos importados. Com isso aumentaram demais os preços de materiais usados pela equipe de produção. Somado a esse desagravo, a Nestlé mudou sua estrutura administrativa e a nova administração não chegou a um acordo com Fernandes e Palácios para a produção de uma segunda temporada. Em assim sendo, o episódio 38 foi o último a ser produzido, encerrando de vez toda e qualquer possibilidade de se produzir o episódio 39, planejado inicialmente para ser o último da primeira temporada do programa.
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HQs
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Em 1965 o ator Carlos Miranda abandonou carreira artística para ingressar na Academia de Polícia e se tornar policial rodoviário de verdade, a pedido do Comandante Geral da Força Pública, General João Franco Pontes. Seu único retorno ao meio ocorreu como convidado especial no episódio 15 da série de TV "Águias de Fogo" (produzida por Ary Fernandes em 1967/68).
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"O Vigilante Rodoviário" voltou a ser exibido pela TV Tupi Canal 4 de SP em 1967/68. Nos anos 70, coube a TV Globo reprisar o programa nos anos de 1971/72.
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Em 1978, o Ministério da Cultura - em conjunto com a Embrafilme - resolveu produzir uma nova série de TV e a primeira a ser escolhida foi "O Vigilante Rodoviário". O problema inicial foi elenco, visto que Carlos Miranda exercia outra atividade e até por conta da idade já não se encaixava mais no papel. Coube então a um jurado do Programa Sílvio Santos a responsabilidade de reviver o herói. Tal jurado chamava-se Antonio Fonzar, era o galã do momento e tinha acabado de ganhar na ocasião o título de "homem mais bonito do Brasil".
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O Vigilante Rodoviário - Versão 1978
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Para essa nova produção o automóvel Simca foi substituído por um Dodge Dart, veículo este comprado por Ary Fernandes, para viabilizar o início das filmagens do novo piloto. Ao todo, foram 40 dias de trabalho para compor um episódio colorido de uma hora de duração. Depois de pronto, por problemas ligados a Embrafilme, o projeto foi cancelado e tal episódio fora engavetado.
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No ano de 2008, Ary Fernandes (Procitel) e o Canal Brasil (Globosat) selaram uma parceria visando trazer novamente para a TV os episódios da série original. Dos 38 episódios produzidos, 1 estava totalmente deteriorado (perdido) e outros 2 apresentaram problemas que impossibilitaram sua recuperação. Tais episódios, dados como perdidos, foram: "O Pagador", "Orquídea Glacial" e "Os Cinco Valentes". Desta forma, foram exibidos pelo Canal Brasil (Globosat) - entre 09 de março de 2009 e 25 de Julho de 2010 - 35 episódios recuperados da série original.
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Em Novembro de 2009 a série foi lançada em DVD, pelo selo independente Spectra Nova. O lançamento trouxe, em um box com 4 discos, todos os 35 episódios recuperados. Muitos que compraram o produto notaram o pouco cuidado na remasterização de alguns episódios, que mesmo recuperados, ainda apresentam evidentes sinais de desgaste, algo que poderia ter sido melhor trabalhado com o recurso tecnológico já existente na ocasião. Outro detalhe merecedor de atenção é que uma única abertura foi adotada para todos os episódios. Trata-se da mesma utilizada no longa "O Vigilante Rodoviário", que é na verdade uma compilação de 05 episódios da série ("O Diamante Grã-Mongol", "A História do Lobo", "Remédios Falsificados", "A Repórter" e "Os Romeiros"). Segundo a Procitel, a abertura original utilizada na época da exibição em TV ainda existe, mas está em estado precário.
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DVD
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No dia 26 de Julho de 2010, após finalizar a exibição da série original, o Canal Brasil exibiu pela primeira vez o episódio piloto da versão de 1978, até então nunca mostrado ao público.
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Em Janeiro de 2011 a coluna de Mônica Bergamo no Jornal Folha de SP publicou que uma nova versão do Vigilante Rodoviário poderia ser produzida. A releitura seria feita pela Academia Filmes, que havia negociado os direitos com a família de Ary Fernandes. Ainda segundo tal matéria, Newton Cannito seria o responsável por roteirizar os novos episódios. O projeto não foi em frente, mas a Procitel  - empresa de propriedade da família de Ary Fernandes - continua aberta a novas propostas.
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Carlos Miranda está aposentado. Natural do bairro paulistano da Moóca, nasceu em 29 de Julho de 1933. Reside atualmente na cidade de Águas da Prata, interior de São Paulo. A bordo de um Simca Chambord 1959, participa de eventos onde aparece trajado como vigilante rodoviário.
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Carlos Miranda - Hoje e Ontem
Carlos Miranda em Evento
Carlos Miranda em Evento com Hebe Camargo
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Em 29 de Agosto de 2010, aos 79 anos, Ary Fernandes faleceu vitimado por um infarto. Segundo contou em várias ocasiões, concluiu "O Vigilante Rodoviário" muito famoso e sem nenhum dinheiro. Depois de produzir outra série para TV - "Águias de Fogo" (1967/68) - passou a se dedicar ao cinema, atuando como produtor e diretor. Dirigiu mais de 130 filmes. Seu último trabalho foi a autobiografia "Ary Fernandes - Sua Fascinante História", lançada em parceria com o escritor Antonio Leão da Silva Neto, em 2006.
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Ary Fernandes em 2009
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Alfredo Palácios nasceu em São Paulo no dia 31 de Janeiro de 1922. Diretor, roteirista e produtor, trabalhou em mais de 70 produções cinematográficas, entre 1951 e 1982. Consta que faleceu em 1997, aos 74 anos de idade.
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Curiosidades
  • Para rodar o episódio-piloto foi necessária a ajuda de quatro policiais rodoviários para cuidar do trânsito, enquanto eram feitas as filmagens;
  • O nome original do programa era "O Patrulheiro”, título esse que chegou a ser utilizado durante a produção dos três primeiros episódios. Pouco tempo antes do lançamento oficial na TV, surgiu uma série chamada "Patrulheiros Toddy" e isso fez com que Ary Fernandes alterasse o nome da série;
  • As motos não possuíam rádio e foi necessária uma adaptação;
  • Os rádio-transmissores instalados nos carros, motos e jeeps não funcionavam de verdade;
  • A direção da TV Record gostou muito do piloto produzido e propôs exclusividade para a exibição do programa. Isso não ocorreu porque o alcance da emissora ficava restrito a São Paulo e Rio de Janeiro;
  • A série era transmitida às quartas-feiras em São Paulo e às quintas no Rio de Janeiro, onde curiosamente o sucesso era ainda maior;
  • "O Vigilante Rodoviário” tinha como característica ser rodado no Estado de São Paulo, mas 3 episódios foram produzidos em outros estados: “O Sósia” (RJ), “Aventura em Vila Velha” (PR) e “Aventura em Ouro Preto” (MG);
  • O episódio rodado no Paraná - “Aventura em Vila Velha” - foi a estréia do ator Ary Fontoura em uma série de TV;
  • A maior parte dos episódios foram gravados na altura do km 38 da Rodovia Anhanguera (SP), devido ao clima que se apresenta ensolarado grande parte do ano, fator fundamental para filmagens externas;
  • Quando a série estreou pela TV Tupi, haviam apenas 12 episódios concluídos;
  • Cada episódio demandava aproximadamente 15 dias para ser finalizado;
  • A música-tema da série foi composta por Ary Fernandes e gravada pelo grupo Titulares do Ritmo. Um segundo tema foi produzido por outro compositor, mas acabou sendo usado como música incidental em alguns episódios;
  • Carlos Marti foi o responsável pela criação do logotipo do Vigilante, que não tinha nada a ver com a polícia. Muitos porém acreditavam que aquele era o brasão da Polícia Rodoviária;
  • "O Vigilante Rodoviário" recebeu expressivos troféus, tais como: Troféu Roquete Pinto, Sete Dias na TV e Troféu Imprensa;
  • A empresa responsável pelos direitos autorais de O Vigilante Rodoviário chama-se Procitel – Produções Cine Televisão Ltda., de propriedade da família de Ary Fernandes.
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O Vigilante Rodoviário - Abertura
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Tema Musical
Autor: Ary Fernandes

Vigilante Rodoviário!
De noite ou de dia,
Firme no volante,
Vai pela rodovia,
Bravo Vigilante!
Guardando toda estrada,
Forte e confiante,
É o nosso camarada,
Bravo Vigilante!
O seu olhar amigo,
É um farol que avisa do perigo,
Audaz e temerário,
Para agir a todo instante,
Da estrada é o Vigilante,
Vigilante Rodoviário!
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Lista de Episódios
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01. Os Cinco Valentes

02. O Recruta
03. Bola de Meia
04. O Ventríloquo
05. Extorsão
06. Jogo Decisivo
07. Pânico no Ringue
08. Zuni, o Potrinho
09. Remédios Falsificados
10. Os Romeiros
11. A Repórter
12. O Diamante Grã-Mongol
13. O Fugitivo
14. Aventura em Ouro Preto
15. Chantagem
16. O Homem do Realejo
17. A Eleição
18. A Pedreira
19. O Pagador
20. O Sósia
21. Aventuras do Tuca
22. O Invento
23. Terras de Ninguém
24. O Rapto do Juca
25. Aventura em Vila Velha
26. O Pombo-Correio
27. Ladrões de Automóveis
28. O Suspeito
29. O Garimpo
30. A Fórmula do Gás
31. Café Marcado
32. O Assalto
33. O Mágico
34. O Mapa Histórico
35. O Mordomo
36. A História do Lobo
37. Mistério do Embú
38. A Orquídea Glacial
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Longas para Cinema
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1962 - O Vigilante Rodoviário
1964 - O Vigilante Contra o Crime
1966 - O Vigilante e os Cinco Valentes
1967 - O Vigilante em Missão Secreta
1967 - O Mistério do Taurus 38
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Fontes: Arquivo Pessoal, Internet, Central Retrô TV (retrotv.uol.com.br)
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3 comentários:

  1. Quero parabenizar pelo excelente trabalho de pesquisa realizado por este Blog.
    Faço algumas observações:
    -Insisti várias vezes com meu pai (Ary Fernandes), sobre quem era o dublador do Carlos.
    Embora sua memória sempre tenha sido notável, o nome desse dublador que era um radioator da Rádio São Paulo, fugia de sua mente.
    Sendo assim, não tenho como creditar a Astrogildo Filho como sendo o dublador do personagem.
    -Quanto a volta para uma nova série, o projeto citado não foi em frente, porém continuamos abertos à novas propostas!
    -Quanto a abertura usada para série atualmente, não é do episódio “A Repórter” como está publicado, e sim do longa “O Vigilante Rodoviário”, que é a compilação de 5 episódios:
    1- O Diamante Grão Mogol
    2- A História do Lobo
    3- Remédios Falsificados
    4- A Repórter
    5- Os Romeiros
    Por este motivo, aparece o nome dos atores que participaram destes cinco episódios, entre eles a atriz Rosamaria Murtinho.
    Escolhemos está abertura como oficial, pois a original utilizada para série está em estado precário.
    Nós a temos, porém sem condições para integrar a atual coletânea.
    Está e uma curiosidade interessante para publicar no Blog.

    Mais uma vez, parabéns pelo trabalho de pesquisa, bem fiel a história real dos bastidores.
    Fora as publicações oficiais sobre a série, classifico como um dos melhores que tive oportunidade de ler!👍

    Vania Fernandes Pesce
    PROCITEL

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    1. Vania, agradeço de coração suas palavras. Estou inclusive muito emocionado com isso. Sou fã da série desde pequeno. Nasci em 1958. Minha mãe me levou ao cinema para ver um longa e lembro de ver o Inspetor Carlos parado na frente do cinema com o cão Lobo, o qual tive a oportunidade de tocar. Vou fazer as correções conforme apontado. Este blog tem também matéria sobre a série Águias de Fogo. Forte abraço!

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